Faça HIIT do Jeito Certo: HIIT de Intervalos Curtos

Descubra como fazer e para que serve o HIIT curto, com exemplos de protocolos utilizados em estudos científicos.

Foto: asawin em pxhere

Este artigo é parte de uma série sobre HIIT, você pode encontrar os demais artigos aqui:




Embora possa parecer algo novo e super atual (uma “modinha”), o Treino Intervalado de Alta Intensidade (HIIT, do inglês High Intensity Interval Training) não é nenhuma novidade. Esse tipo de exercício possui um histórico de longa data, especialmente no treinamento esportivo voltado para a performance.

Se apenas considerarmos o significado do nome HIIT, muitos tipos e métodos de treinamento podem se encaixar na descrição de treino intervalado de alta intensidade. Há séculos as pessoas têm praticado exercícios envolvendo períodos de esforços intensos, alternados com períodos de descanso.

Já o HIIT moderno, tem sua origem no início dos anos 1900. No entanto, abordagens mais sistemáticas de HIIT, tais como as conhecidas hoje em dia, começaram a aparecer por volta da década de 1930, com os trabalhos do treinador alemão Woldemar Gerschler em associação com o cardiologista alemão Dr. Herbert Reindel.

Desde então, o método vem sendo estudado e aprimorado por treinadores e cientistas, surgindo diferentes protocolos e formas de controle de variáveis do treinamento. Atualmente, o HIIT pode ser subdividido em quatro tipos:

HIIT de intervalos curtos, HIIT de intervalos longos, SIT (Sprint Interval Training) e RST (Repeated Sprint Training).

Um método bastante comum de HIIT é o treino com intervalos de curta duração, que permite acumular uma boa dose de trabalho com menor percepção de esforço e fadiga pelos participantes.

Por esse motivo, o HIIT Curto é o nosso escolhido para dar início a essa série.


O Que É o HIIT Curto

O HIIT de intervalos curtos consiste em tiros curtos submáximos de 15 segundos a 1 minuto, alternado com intervalos de descanso com duração de 50 a 100% do tempo do tiro, os quais podem ser passivos (parado/caminhando) ou ativos (comumente a 40-50% da intensidade do tiro).


Qual Exercício Escolher

Tradicionalmente, o HIIT tem sido aplicado e estudado em exercícios cíclicos de natureza mais aeróbia, como a corrida, ciclismo, remo e natação (ainda que na natação os métodos apresentem algumas diferenças específicas).

Dessa forma, os exemplos utilizados neste artigo serão mais voltados para esses exercícios.

Isso não quer dizer que o método tenha que ser limitado a tais atividades, podendo ser adaptado para diversas modalidades, por exemplo, elíptico, subir escadas, pular corda, empurrar trenó, patinação, esqui, corda naval, dentre outras.


Como Determinar a Intensidade

Um dos poucos pontos negativos do HIIT curto é a necessidade de se controlar a intensidade do exercício por meio da velocidade/potência. Isso não é problema se você estiver utilizando uma esteira ergométrica, por exemplo, agora se você for fazê-lo na rua pode ser difícil determinar a intensidade de maneira adequada.

Para controlar a intensidade do treino intervalado, antes precisamos conhecer o conceito de consumo máximo de oxigênio (VO2max). VO2max é a capacidade máxima do corpo em transportar e metabolizar oxigênio durante um determinado exercício físico.

Isso é descoberto através de um teste ergoespirométrico incremental, normalmente realizado em esteira ou bicicleta, em clínicas ou laboratórios. Contudo, existem alguns métodos “caseiros” para descobrir a intensidade a ser utilizada no HIIT.

No HIIT Curto, a intensidade dos tiros é de aproximadamente 100-105% da intensidade de VO2max (vVO2max/pVO2max), que é a velocidade/potência onde o consumo de oxigênio atinge um platô (VO2max), mesmo aumentando-se a intensidade do exercício.

Vamos ver, então, como calcular essa intensidade.


Teste de Intensidade Estimada: Faça Você Mesmo

Após um aquecimento de cerca de 5 minutos em intensidade baixa no exercício que você irá testar, faça o seguinte:

  • Na esteira ergométrica¹
O teste incremental na esteira começa a cerca de 8 km/h. Dependendo da aptidão física do indivíduo testado, pode-se reduzir essa velocidade.

Aumenta-se a velocidade da esteira em 1 km/h a cada 1 ou 2 minutos (2 minutos é mais preciso, porém o teste fica mais longo). Prossegue-se com o teste até que o participante atinja a fadiga e não seja mais capaz de correr na velocidade da esteira. A velocidade alcançada no último estágio é a velocidade pico.

O pico de velocidade que você pode chegar em um teste incremental é, aproximadamente 5 a 10% maior do que a vVO2max obtida em um teste ergoespirométrico, correspondendo a um ou dois estágios após a estabilização do VO2max. Assim, basta diminuir cerca de 5 a 10% (ou 1 a 2 km/h) da velocidade final alcançada no teste e pronto. Você descobriu sua vVO2max!

  • Na bicicleta ergométrica²
Para esse teste, você precisa de uma bicicleta que marque a potência (em Watts) e a cadência do pedal (em RPM).

Há duas formas de fazê-lo:

No teste utilizando a potência como variável, você mantém uma cadência constante (aproximadamente 90 RPM) enquanto a carga da bicicleta é aumentada. A carga inicial é de cerca de 125W, sendo aumentada em 25W a cada minuto. O teste termina quando atinge-se a fadiga e não é mais possível manter a cadência do pedal constante.

Já no teste utilizando a cadência como variável, a carga é mantida constante - 2,75W por quilo de peso corporal - enquanto a cadência aumenta. A cadência inicial é de 70 RPM, aumentando-se 10 RPM a cada minuto. O teste acaba quando não for possível manter a cadência exigida. Nesse caso, a cadência também é a variável que será manipulada durante o treino.

As cargas acima podem ser ajustadas conforme a aptidão física dos participantes.

Tal como no teste da esteira, a potência/cadência atingida, em geral, costuma ser um ou dois estágios (cerca de 5 a 10%) acima da vVO2max.

  • No remoergômetro³
Embora todo mundo tire sarro do Crossfit, graças a ele a popularidade desse fantástico equipamento de treino aumentou exponencialmente no Brasil.

Coloque o visor para mostrar, pelo menos, os Watts e a voga (remadas por minuto). Comece o teste a 40W, aumentando a carga a cada minuto em 20W para homens e 15W para mulheres. O teste é encerrado quando não for mais possível manter a potência (W) solicitada.

Tal como nos outros testes, a pVO2max é um ou dois estágios inferior à potência pico alcançada, assim reduza-a 5 a 10% na hora de aplicar os resultados ao treino de HIIT.

  • Na pista de atletismo
Em uma pista com distância demarcada e controlada, corre-se a maior distância possível em 5 ou 6 minutos. A distância total percorrida é multiplicada por 12 (no caso de 5 minutos) ou 10 (no caso de 6 minutos). O valor encontrado dividido por 1000 é, em média, a vVO2max em km/h.

Segundo estudos, o tempo médio para exaustão em uma corrida à vVO2max é de 4 a 8 minutos, de modo que a vVO2max encontrada no teste é uma estimativa, ainda assim, ela apresenta uma correlação de cerca de 95% com outros testes comumente utilizados.

Obviamente, o teste tem suas limitações. Ele pode ser influenciado por estratégias no pace e o resultado é mais confiável para corredores com experiência em manter-se na vVO2max, mas ele pode sim ser usado na falta de outros equipamentos.


Caso a modalidade que você queira não esteja aqui, pesquise no Google para ver se existe algum teste incremental específico.


Quantos Tiros Devo Fazer

O tempo de exercício deve permitir atingir de 5 a 10 minutos na zona de VO2Max, assim, no HIIT curto, cerca de 10 a 15 minutos de trabalho de tiros (não contando os descansos) são normalmente necessários.

Esse número pode ser maior (chegando a até 20 minutos) caso variáveis como descanso passivo e número de séries reduza muito o consumo de oxigênio durante os intervalos.

O número de intervalos, então, deve levar em conta o tempo do tiro e o tempo total de trabalho pretendido.

Por exemplo, 30 tiros de 30s/30s totalizam 15 minutos de trabalho, enquanto 10 x 1min/1min são 10 minutos de trabalho. Para conseguir os mesmos 10 minutos com tiros de 15 segundos, seria necessário fazer 40 tiros de 15 segundos.

Como isso pode ser impraticável em uma única série, é possível dividir o volume em mais séries (ex.: 2x20 tiros de 15s/15s). Já 15 x 1min/1min são perfeitamente factíveis em uma única série (embora talvez leve um tempo até você estar apto a fazê-lo).


Como Deve Ser o Descanso

O descanso pode ser ativo (apenas diminuindo-se a intensidade do exercício) ou passivo (parando completamente ou caminhando).

No descanso ativo reduz-se a intensidade do exercício para 40-50% da intensidade de VO2max.

Sua vantagem é manter a frequência cardíaca (FC) mais elevada, bem como um maior consumo de oxigênio durante o intervalo. Um descanso ativo mais curto do que o intervalo do tiro está associado com um maior tempo de trabalho na zona de VO2max e consequente melhora na performance.

O descanso passivo, por sua vez, permite executar um maior número de intervalos, acumulando mais trabalho total e maior duração da sessão, mas não necessariamente maior tempo na zona de VO2max.

Além disso, o descanso ativo pode ser impraticável em certos equipamentos, como na esteira ergométrica, já que ela leva muito tempo para acelerar e desacelerar. Nesse tipo de caso, o descanso passivo (pulando para fora da cinta da esteira, por exemplo) é recomendado.


É Seguro Fazer HIIT Curto?

O HIIT, conforme a concepção do Dr. Reindel, foi criado para melhora da aptidão física de cardiopatas.

Um estudo publicado em 2011 submeteu idosos (média de 62 anos) cardiopatas a uma sessão de HIIT em bicicleta ergométrica, composta por 2 séries de 20 tiros de 15s a 100% da vVO2max por 15s de descanso passivo, com intervalo de até 4 minutos entre as séries, e comparou com uma sessão de treino aeróbio contínuo (famoso cardio) de 29 minutos, em média, com intensidade de cerca de 70%.

Não foram encontrados marcadores de lesão cardíaca induzida pelo exercício em nenhum dos protocolos. Além disso, os voluntários relataram preferir fazer HIIT ao treino contínuo.


HIIT Curto Emagrece?

Outro estudo, este feito na Tunísia, em 2013, submeteu 34 garotas (em média, 16 anos) obesas a 12 semanas de HIIT na intensidade de 100-110% da vVO2max ou um treino intervalado em intensidade moderada (70-80% da vVO2max). Ambos os protocolos, feitos em uma pista ao ar livre, foram idênticos e progressivos, exceto pela intensidade do exercício, e consistiam em 2 séries de 6 a 8 tiros de 30s, intercalados com 30s de descanso ativo a 50% da vVO2max, e 4 minutos de descanso entre as séries.

Os dois grupos diminuíram o peso total, IMC (índice de massa corporal) e percentual de gordura. Alterações positivas no colesterol LDL, HDL e adiponectina também foram encontradas em ambos os grupos, porém apenas o grupo do HIIT diminuiu a circunferência da cintura, colesterol total e triglicerídeos. A resistência à insulina também melhorou em ambos os grupos, mas foi melhor para o grupo que fez HIIT.

Ah, as meninas não fizeram dieta ou quaisquer alterações em sua alimentação e, mesmo assim, emagreceram. Os autores concluíram que “HIIT parece ser uma abordagem melhor para a prevenção e controle da obesidade em adolescentes e nas desordens metabólicas, cardiovasculares e hormonais observadas nessa população, comparado ao treino intervalado em intensidade moderada”.


Como Usar Essa Informação

Baseado no que foi visto até agora, as recomendações básicas para o treino de HIIT de intervalos curtos, passo a passo, seriam:

  1. Escolher a modalidade de exercício e saber sua intensidade de VO2max (vVO2max ou pVO2max) na mesma;
  2. Iniciar com um aquecimento de cerca de 5 minutos a 60-70% da vVO2max;
  3. Fazer tiros (10 a 40* seria uma quantidade interessante) de 15 segundos a 1 minuto, procurando acumular um trabalho total de 10 a 15 minutos (podendo chegar até a 20 minutos), na intensidade de 95 a 110% da vVO2max;
  4. Usar descanso passivo (parado ou caminhando) ou ativo (intensidade de 40-50% da vVO2max) entre os tiros, com duração igual ao tempo do tiro ou menor, mas no mínimo metade dele;
  5. Caso o número de tiros seja muito alto (por exemplo 20 ou mais*), pode-se dividir os tiros em duas ou mais séries, com intervalos de 3-4 minutos entre as mesmas.
*Esses números são apenas uma estimativa baseada no tempo total de trabalho pretendido e não estão escritos em pedra. Ajuste-os de acordo com suas próprias capacidades.


Experimente variar o treino com diferentes durações de tiros e descanso.

Em três semanas falaremos sobre o HIIT de intervalos longos, mas até lá você tem diversas possibilidades de variações para testar o HIIT curto.



Fontes:
1. Machado FA, Kravchychyn AC, Peserico CS, da Silva DF, Mezzaroba PV. “Incremental test design, peak 'aerobic' running speed and endurance performance in runners”. J Sci Med Sport. 2013 Nov;16(6):577-82.
2. Deakin G, Davie A, Zhou S. “Reliability and Validity of an Incremental Cadence Cycle VO2max Testing Protocol for Trained Cyclists”. Journal of Exercise Science & Fitness. 2011. 9. 31-39.
3. Hofmann P, Jürimäe T, Jürimäe J, Purge P, Maestu J, Wonisch M, Pokan R, von Duvillard SP. “HRTP, prolonged ergometer exercise, and single sculling”. Int J Sports Med. 2007 Nov;28(11):964-9
4. Buchheit M, Laursen PB. “High-intensity interval training, solutions to the programming puzzle: Part I: cardiopulmonary emphasis”. Sports Med. 2013 May;43(5):313-38.
5. https://www.scienceofrunning.com/2016/08/a-brief-history-of-interval-training-the-1800s-to-now.html?v=19d3326f3137
6. Guiraud T, Nigam A, Juneau M, Meyer P, Gayda M, Bosquet L. “Acute Responses to High-Intensity Intermittent Exercise in CHD Patients”. Med Sci Sports Exerc. 2011 Feb;43(2):211-7.
7. Racil G, Ben Ounis O, Hammouda O, Kallel A, Zouhal H, Chamari K, Amri M. “Effects of high vs. moderate exercise intensity during interval training on lipids and adiponectin levels in obese young females”. Eur J Appl Physiol. 2013 Oct;113(10):2531-40.

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