Agachamento x Elevação Pélvica: Qual o Melhor Exercício para Hipertrofia dos Glúteos?

Agachamento é duas vezes mais eficiente do que a elevação de quadril para aumentar seus glúteos, segundo estudo.



Antigamente, nossos treinos de membros inferiores aqui no Brasil eram baseados em exercícios como agachamento, leg press, stiff, afundo e levantamento terra.

Quanto à elevação de quadril, certamente ela era conhecida em nosso país, mas normalmente costumava ser chamada de ponte e era feita no chão e sem o uso de pesos, e não com as costas sobre um banco e uma barra apoiada no quadril. Sua prática também era mais comum em aulas de ginástica localizada, Pilates ou naqueles programas de treino em casa que eram vendidos em fitas VHS para assistir no seu vídeo cassete.

Graças à internet (ou infelizmente, nesse caso), a velocidade de disseminação das informações hoje em dia é milhares de vezes mais rápida, sendo que temos acesso quase instantâneo ao que está sendo feito em outros países, inclusive aos exercícios da moda.

Um exercício que tem tomado as academias brasileiras atualmente é, justamente, a elevação de quadril. Aparentemente, ela se popularizou nos Estados Unidos como um excelente exercício para os glúteos e de lá se espalhou como um (Corona)vírus ao redor do mundo.

Só que sua eficácia nunca tinha sido comparada, de fato, aos exercícios mais tradicionais. Ao menos até agora.

E, coincidentemente ou não, esse estudo não poderia ter sido feito em um país mais icônico quando o assunto é bunda. É claro que estou falando daqui do Brasil.

Finalmente, um estudo feito por pesquisadores brasileiros levou o agachamento e a elevação pélvica ao octógono para disputar quem fica com o cinturão de campeão do bumbum na nuca.


O Que Eles Fizeram

O pesquisador Matheus Barbalho e seus colegas, do grupo do Dr. Paulo Gentil, dividiram 22 mulheres jovens com experiência de no mínimo três anos de musculação, acostumadas a realizar tanto o agachamento quanto a elevação de quadril em seus treinos, em dois grupos: um grupo treinou somente o agachamento durante 12 semanas; o outro fez apenas a elevação pélvica.

O agachamento (profundo) foi feito com a barra nas costas e em amplitude máxima - cerca de 140º de flexão de quadril (ou seja, lá no chão). A elevação pélvica foi realizada com as costas em um banco e os pés no chão, com a barra apoiada sobre a articulação do quadril; o movimento iniciava com os glúteos próximos ao solo e terminava com a extensão completa do quadril.


O Treino

Em ambos os grupos o treino foi realizado apenas uma vez por semana, totalizando 6 séries por sessão/semana, sempre até a falha muscular momentânea. Eles usaram o seguinte esquema de periodização não-linear:

  • Semanas 1, 5 e 9: 6x (séries) de 12 a 15 repetições com 30-60 segundos de descanso entre as séries;

  • Semanas 2, 6 e 10: 6x de 4-6 repetições com descanso de 3-4 minutos;

  • Semanas 3, 7 e 11: 6x de 10-12 repetições com 1-2 minutos de descanso;

  • Semanas 4, 8 e 12: 6x de 6-8 repetições com descanso de 2-3 minutos.


Caso as participantes conseguissem realizar um número de repetições maior do que o proposto, a carga era aumentada de 1 a 5 kg para a sessão seguinte.

Embora não conste no artigo, eu acredito que as voluntárias tenham sido orientadas a não realizar mais nenhum treino (ou exercício) para membros inferiores durante o estudo, e que possivelmente elas tenham continuado a treinar membros superiores normalmente.


Os Testes

Antes e depois das 12 semanas de treino, todas as participantes realizaram testes de força (1RM - uma  repetição máxima) em ambos os exercícios - agachamento e elevação pélvica.

A fim de verificar a hipertrofia, também foi avaliada a espessura muscular do quadríceps (na parte anterior da coxa) e dos glúteos utilizando ultrassonografia (realizada por um profissional não envolvido no estudo).


Os Resultados

E então, qual exercício foi melhor exercício para glúteos e quadríceps, afinal? Primeiro, vamos dar uma olhada nos ganhos de força máxima (1RM) em cada um dos exercícios:

Evolução dos grupos no teste de 1RM em cada exercício
Ganho de Força no Agachamento (esquerda) e Elevação Pélvica (direita) em cada um dos grupos

Vamos começar pelos resultados óbvios e já esperados. A elevação pélvica produziu ganhos significativos em força na própria elevação pélvica (19,3%), porém não aumentou significativamente a força no agachamento (4,3%).

O agachamento, por sua vez, produziu ganhos significativos de força tanto na execução do próprio agachamento (35,9%) quanto da elevação pélvica (13,9%), esta última sem diferenças significativas em relação ao grupo que treinou especificamente a elevação de quadril.

Isso está em linha com pesquisas anteriores, que verificaram que exercícios compostos normalmente conseguem desenvolver a força em exercícios mais isolados quase tão bem quanto praticando o próprio exercício; algumas vezes até melhor.

Agora vamos para o desfecho que realmente nos interessa nesse estudo.

Ladies and Gentlemen, iiit's tiiime!

Mulheres, apertem os cintos (ou afrouxem, dependendo do exercício escolhido), pois...

O agachamento nocauteou bonito a elevação pélvica. Apenas agachar resultou em mais do que o dobro de hipertrofia nos glúteos e ganhos 6 vezes maiores no quadríceps comparado à elevação de quadril.

Hipertrofia dos Glúteos e Quadríceps nos grupos Elevação Pélvica e Agachamento


Isso Não Contraria Pesquisas Anteriores?

Na verdade, não. Nenhum estudo, até o momento, havia comparado diretamente o resultado da execução de ambos os exercícios levando em conta a hipertrofia.

Os poucos estudos que compararam a elevação pélvica contra outros exercícios, como o agachamento, verificaram apenas desfechos relacionados à força muscular/performance ou foram feitos usando eletromiografia (EMG) - um método que capta a atividade elétrica dos músculos - sendo que seus resultados nem sempre estão associados a uma maior hipertrofia. Esses estudos realmente encontraram uma maior ativação dos glúteos durante a elevação de quadril quando comparada ao agachamento ou ao levantamento terra. Inclusive, em uma revisão sistemática, o agachamento profundo ficou em último lugar em ativação EMG dos glúteos dentre outros 24 exercícios.

Apesar disso, no presente estudo o agachamento profundo foi muito mais eficiente para hipertrofia dos glúteos do que a elevação pélvica (que provoca uma ativação eletromiográfica muito maior). Ou seja, quando o assunto é hipertrofia, a coisa muda um pouquinho de figura. E é por isso que os resultados na prática são mais importantes do que as conclusões precipitadas que tiramos através dos mecanismos isolados, justamente o que o estudo de Barbalho e colegas nos mostra.

De acordo com os autores, a vantagem do agachamento pode estar relacionada a uma maior amplitude de movimento. A elevação pélvica tem uma amplitude bem curta (cerca de 45-60º), além de um pico de contração/força na fase final do exercício, os quais também podem ser os motivos responsáveis por esse exercício apresentar uma atividade eletromiográfica tão alta. Já durante o agachamento profundo, o quadril atinge uma amplitude de movimento bem maior (quase completa, considerando boa flexibilidade, prática e destreza no movimento), promovendo um maior alongamento dos glúteos, que pode resultar em maior tensão muscular favorecendo a hipertrofia.


Então É Isso? Podemos Matar e Enterrar a Elevação Pélvica?

Segundo esse estudo, sim. Mas... eu ainda não colocaria o último prego no caixão tão depressa. Esse estudo é sim uma parte importante do quebra-cabeças, mas ainda faltam algumas peças para completarmos a figura.

A tensão muscular certamente é importante, mas não é o único estímulo para hipertrofia. Atualmente, também sabemos que há estímulos hipertróficos associados ao estresse metabólico, embora a causa por trás da hipertrofia via esses estímulos ainda não esteja totalmente compreendida. Um dos principais mecanismos responsáveis por esse estresse metabólico seria a hipóxia provocada pelas contrações musculares (ou pelo uso de garrotes, como no método de oclusão vascular); resumidamente, o sangue não consegue fluir bem através dos vasos sanguíneos quando os músculos estão contraídos, resultando em menor fluxo de oxigênio para os músculos, além de um maior acúmulo de metabólitos (principalmente lactato e H+) que não conseguem ser removidos. O agachamento tem um menor potencial de gerar esse estresse metabólico nos glúteos, já que na fase inicial do exercício (quando estamos em pé) a contração deles é quase nula.

Em compensação, podemos inferir que a elevação pélvica, justamente por causa das características discutidas antes, potencialmente gere uma maior hipóxia e maior stress metabólico nos glúteos quando realizada com menor carga e um maior número de repetições. Assim, é possível que em uma fase de treino onde o objetivo seja provocar maior estresse metabólico (ou usar menores cargas), a elevação pélvica ainda possa ser um exercício interessante para fazer parte do treino, mas isso ainda precisa ser investigado pela ciência. Como esse estudo utilizou uma periodização ondulatória, não foi possível relacionar a hipertrofia a estímulos específicos (tensionais ou metabólicos).

Ainda por cima, a amplitude do agachamento utilizado no estudo foi completa, porém dificilmente vemos agachamentos profundos sendo executados nas academias, havendo pessoas que nem mesmo conseguem atingir essa amplitude, seja por limitações físicas ou motoras. Assim, os resultados limitam-se ao agachamento profundo e não sabemos ainda se um agachamento feito em menor amplitude (paralelo ou parcial) resultaria em maior hipertrofia quando comparado à elevação de quadril.

Além disso, nem tudo gira em torno do tamanho da sua raba. Alguns estudos sugerem que a elevação pélvica pode ser um exercício útil para treinar atletas cuja performance de deslocamento horizontal seja importante no esporte, como velocistas e saltadores em distância.


O Que Isso Significa para Você

Se você é homem, esse estudo, embora tenha sido feito com mulheres, sugere que ninguém (seus amigos, no caso) precisa saber se você está fazendo agachamento para treinar as pernas ou os glúteos (já que aparentemente as mulheres se amarram em glúteos masculinos bem trabalhados), diferentemente do que aconteceria se você fizesse a elevação de quadril.

Já se você é mulher e seu objetivo é hipertrofia, segundo esse estudo, é melhor ficar com o agachamento profundo (e possivelmente suas variações, inclusive agachamento búlgaro e afundos) utilizando a maior amplitude de movimento que sua flexibilidade/mobilidade permitir (lembrando de evitar, por questões de segurança, perder/inverter a curvatura da coluna lombar durante o movimento). Outros exercícios como leg press e levantamento terra (e variações) também são alternativas para compor seu treino de membros inferiores e glúteos, embora não exista nenhum estudo comparando sua eficácia contra a elevação de quadril.

Agora, se você realmente gostar muito da elevação pélvica e for fazê-la de qualquer forma, sugiro que, pelo menos, faça o exercício procurando dar estímulos metabólicos para seus glúteos, ou seja, use séries mais longas, com menos carga e menor tempo de descanso entre as séries (drop-sets se encaixam razoavelmente bem nesse método); embora a ciência possa vir a mostrar futuramente que isso também não funciona tão bem quanto o agachamento.

Além disso, a recuperação pode ser mais lenta após uma sessão de membros inferiores contendo exercícios com as características do agachamento - grande amplitude e alta tensão muscular na fase mais alongada do movimento, gerando maior dano ao tecido muscular (quem nunca ficou com os glúteos doloridos por dias após um treino de agachamento ou afundo) - do que após um treino de elevação pélvica, o que deve ser um outro fator a ser levado em conta.

Resumindo: Se quer um bumbum na nuca, faça agachamento profundo!



Fonte:
1. Barbalho M, Coswig V, Souza D, Serrão JC, Campos MH, Gentil P. “Back Squat vs. Hip Thrust Resistance-training Programs in Well-trained Women”. Int J Sports Med. 2020 Jan 23.

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