Posição dos Pés no Leg Press

Descubra se é possível trabalhar diferentes músculos das pernas apenas mudando o posicionamento dos pés no Leg Press.

Mulher - Leg Press Horizontal
Foto: Ingrid Oliveira por Fernando Frazão/Agência Brasil [CC BY 3.0]


Há um rumor nas conversas de academia ao redor do mundo de que a posição dos pés no Leg Press determina qual músculo vai "pegar mais" (ou seja, vai ser mais ativado) durante a execução do exercício.

Ok, talvez a maioria dos marombeiros esteja discutindo mesmo sobre qual pegada na rosca direta trabalha mais o pico do bíceps ou qual exercício de tríceps pega mais a parte interna, mas esse tipo de recomendação realmente existe em relação ao Leg Press também.

Se você não sabe do que estou falando, talvez a imagem abaixo ajude a esclarecer as coisas:

Posições dos pés no Leg Press


Você pode não ter escutado isso na sua academia ainda, mas a internet está cheia dessas coisas.

Segundo as recomendações da imagem acima, fazendo a 1ª posição do ballet (e uns pliés) no Leg Press você trabalharia mais o músculo Vasto Medial Oblíquo (VMO), aquele músculo em forma de gota que fica na parte interna da coxa, logo acima do joelho, e que é bastante importante para o correto alinhamento da patela e para a integridade de seus joelhos. A fraqueza desse músculo é frequentemente associada com dores nos joelhos e condromalácia patelar.

Mas será que essas recomendações são baseadas em ciência ou em "sentimentos" (pois os praticantes de musculação sentiriam esses músculos trabalharem mais conforme a posição dos pés adotada)?

Para descobrir isso, analisamos os principais estudos científicos que avaliaram diferentes posições e formas de executar o Leg Press. Veja o que encontramos:


Mas primeiro...


Como a Ciência Estuda Isso?

O estudo da ativação muscular em humanos é feito através de uma técnica chamada Eletromiografia (EMG).

A EMG consiste em colocar eletrodos bastante sensíveis sobre a superfície dos músculos a serem analisados (por cima da pele, embora exista também um método intramuscular). Esses eletrodos captam os pequenos sinais elétricos gerado pelos músculos durante sua contração, os quais são amplificados e transmitidos para um computador, que coleta os dados e gera gráficos posteriormente interpretados pelos cientistas.

Através desses dados é possível quantificar a ativação de determinado músculo durante um certo movimento ou exercício, bem como o grau de ativação comparado a uma contração máxima daquele músculo.


Um dos estudos mais completos investigando a ativação eletromiográfica no Leg Press foi publicado em 2001 na revista Medicine & Science in Sports & Exercise, de autoria de Rafael Escamilla e outros pesquisadores norte-americanos.


O Que Eles Fizeram

Os pesquisadores recrutaram 10 homens jovens (média de idade de mais ou menos 30 anos), com uma média de 9,5 anos de experiência em treino resistido (i.e. musculação) e os fizeram realizar séries de Leg Press e Agachamento com uma variedade de posições dos pés e afastamento das pernas: Leg Press com os pés no alto da plataforma, Leg Press com os pés embaixo na plataforma, Agachamento e Leg Press com os pés próximos (largura do quadril) ou afastados (2 vezes a largura do quadril) e com os pés paralelos (0º de rotação) ou com os pés abduzidos (30º de rotação externa - ponta dos pés para fora).

Eles encheram os voluntários de eletrodos e fios a fim de avaliar a ativação muscular dos músculos Reto Femoral, Vasto Lateral e Vasto Medial (quadríceps), Bíceps femoral (isquiotibiais lateral), Semimembranoso/Semitendinoso (isquiotibiais medial) e gastrocnêmios (panturrilha). Os participantes realizaram 4 repetições com uma carga equivalente a 12 repetições máximas (12RM) em cada exercício.


O Que Eles Encontraram

Apesar de os pesquisadores verificarem uma maior atividade muscular em geral no agachamento, o que nos interessa, no momento, são as diferenças encontradas entre as 8 variações de Leg Press analisadas.

O que eles encontraram foi que não houve diferenças significativas em relação à abdução (rotação) dos pés na ativação dos músculos avaliados em nenhum dos exercícios. Além disso, não foram verificadas diferenças significativas na ativação muscular do reto femoral, vasto lateral, vasto medial e gastrocnêmios em nenhuma variação do Leg Press.

Houve uma maior ativação (pequena, mas significativa) dos isquiotibiais (tanto lateral quanto medial) no Leg Press com os pés no alto da plataforma e afastados.

Também foi verificado um maior pico de ativação do reto femoral no Leg Press baixo com os pés próximos (comparado às outras variações) e dos gastrocnêmios no Leg Press baixo (comparado a qualquer posição do Leg Press alto).

A limitação prática desse estudo, na verdade, foi o aparelho de Leg Press utilizado. Ainda que o aparelho seja considerado um Leg Press, sua posição deitada é muito mais semelhante a um Agachamento Hack do que a um Leg Press normalmente encontrado na maioria das academias. Veja as fotos do artigo:

Leg Alto x Leg Baixo no estudo de Escamilla
Leg Press Baixo (cima) x Leg Press Alto (embaixo) - Escamilla et al. (2001)


Pessoalmente, eu já vi esse tipo de aparelho de Leg Press em uma ou outra academia, mas sei que não é muito comum de ser encontrado, o que torna os resultados práticos do estudo pouco relevantes, a menos que você esteja comparando-os com um Agachamento Hack.


Mais Sobre a Rotação dos Pés no Leg Press

Um outro estudo, da Universidade de São Carlos/SP(2), verificou os efeitos da rotação da tíbia (adução e abdução dos pés) no Leg Press isométrico (ou seja, fazendo força sem mover o equipamento) com os joelhos a 90º. Nessa pesquisa também foi usado o Leg Press Horizontal deitado. O que eles encontraram foi uma ativação maior do Vasto Lateral com a rotação interna da tibia (pés virados pra dentro, aduzidos).

Além disso, nenhuma das posições dos pés testadas demonstrou maior ativação seletiva do VMO, uma busca constante tanto em estudos conduzidos por educadores físicos quanto por fisioterapeutas, conforme já explicado anteriormente sobre o papel desse músculo na saúde dos seus joelhos.


E Quanto a Altura dos Pés no Leg Press

Quanto a esse quesito há uma pesquisa bem interessante realizada pelo Dr. Paulo Gentil, Bruno Fischer e outros colegas em 2005.

Nesse estudo, eles recrutaram 10 homens com experiência de 6,5 anos de musculação, todos habituados com o Leg Press 45º e os submeteram a dois testes: Leg Press com os pés Elevados (pontas dos dedos no limite superior da plataforma) ou Leg Press com os pés Baixos (calcanhares no limite inferior da plataforma).

Os voluntários executaram 10 repetições com uma carga equivalente a 20% de 1RM em ambas as posições, com uma limitação de 110º de flexão de joelho, e foi medida a atividade eletromiográfica do quadríceps e dos isquiotibiais (posteriores da coxa).

Os pesquisadores verificaram que a execução do Leg Press com os pés Elevados promoveu uma ativação 5,14% maior nos posteriores da coxa, enquanto a execução do Leg Press Baixo obteve uma ativação 5,29% maior no quadríceps.

Uma importante conclusão dos cientistas foi a seguinte:

"No entanto, estes resultados não indicam que os isquiotibiais sejam mais ativados que o quadríceps femoral, pois em ambas as variações o quadríceps sempre foi o motor primário (dados não publicados)".


E Algum Estudo Mediu a Ativação dos Glúteos?

Sim. Em 2008, um grupo de pesquisadores brasileiros da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) publicou um estudo no Journal of Strenght and Conditioning Research comparando o Leg Press 45º e o Leg Press Horizontal Alto e Baixo.

Eles recrutaram 14 mulheres jovens (média de 21,5 anos), com pelo menos 6 meses de experiência em musculação e as submeteram a uma série de 5 repetições a 40 e 80% de 1RM nas três variações de Leg Press.

Os pesquisadores mediram a atividade eletromiográfica dos músculos Reto Femoral, Vasto Lateral, Bíceps Femoral, Gastrocnêmio e Glúteo Máximo.

Eles verificaram que, tanto com cargas moderadas quanto com cargas altas, o reto femoral e os gastrocnêmios apresentaram maior ativação no Leg Press 45º (LP45) e no Leg Press Baixo (LPB), comparado ao Leg Press Alto (LPA).

Apenas com cargas altas, o vasto lateral apresentou maior ativação no Leg Press Baixo do que no Leg Press Alto. Da mesma forma, somente com cargas altas, o Glúteo Máximo teve uma maior ativação no Leg Press Alto, comparado ao Leg Press Baixo.

Os autores concluíram que "quando cargas de 40% de 1RM são utilizadas, o LPB e LP45 são recomendados para fortalecer o reto femoral e os gastrocnêmios. Quando uma carga de 80% é selecionada, ...para fortalecer o quadríceps (reto femoral e vasto lateral), nós recomendamos a execução do LPB. Já para fortalecer os glúteos, o LPA deveria ser escolhido".

Minha conclusão, após verificação dos dados e dos gráficos do estudo, ainda iria além:

Se você tem acesso a um Leg Press 45º, faça-o com os pés em uma posição (média) confortável para você na plataforma e "eras isso", já que as diferenças tanto para o quadríceps (no LPB) quanto para os glúteos (no LPA) não foram significativas. Já se você somente tem acesso a um Leg Press horizontal, alternar entre o LPB e o LPA pode ser uma boa opção.


Estudos com Agachamento Não Apresentaram Resultados Muito Diferentes

Um estudo(5) testou o agachamento com os pés paralelos versus 30º e 50º de rotação externa (pontas dos pés para fora). Eles verificaram que, conforme a amplitude se aproximava dos 60 a 90º de flexão de joelho (que foi o máximo que eles mediram) a ativação dos adutores (parte interna da coxa) aumentava, porém a rotação externa aumentava apenas marginalmente mais (3,9 a 7,4 pontos percentuais) com os pés em 30º de rotação. E mais, girar os pés acima de 30º de rotação (até 50º) não fez a menor diferença.

Outro estudo(6) comparou agachamentos com os pés na largura dos ombros versus agachamentos com os pés mais fechados (75% da largura dos ombros) ou mais abertos (140% da largura dos ombros) e, apesar de ter detectado maior ativação muscular para os glúteos e adutores com os pés afastados e uma tendência de maior ativação para o bíceps femoral (posterior da coxa) com os pés fechados, as diferenças entre os valores encontrados no estudo foram pífias.


O Que Isso Significa para Você

Vamos lá.

Leg Press com Rotação de Quadril: Não há diferença, direcione as pontas dos seus pés no ângulo que lhe for mais confortável.

Leg Press com os Pés Fechados ou Afastados: Se não houve diferença no estudo do Escamilla, que usou uma plataforma gigantesca (veja abaixo) para posicionar os voluntários com os pés afastados duas vezes a largura dos quadris, é provável que na sua academia não vá ter um Leg Press onde você possa afastar os pés o suficiente para conseguir um resultado muito diferente. Posicione os pés com o afastamento que for mais confortável para você. Além disso, é possível que a amplitude do movimento seja mais importante do que o afastamento das pernas em relação à ativação dos adutores e glúteos.

Leg Press com pés afastados no estudo de Escamilla
Leg Press Alto com pés afastados com ou sem rotação dos pés - Escamilla et al. (2001)


Altura dos Pés no Leg Press: Aqui realmente parece haver uma maior ativação dos músculos da cadeia posterior (isquiotibiais e glúteos) com os pés mais altos, bem como uma maior ativação do quadríceps com os pés mais baixos. O problema é que, se isso for feito no Leg Press 45º, essas alterações beiram a insignificância (5% é pouco, muito pouco).

Além disso, como sugere o Dr. Gentil, é mais provável que as variações nas posições extremas utilizadas estejam, na verdade, tirando o trabalho de um músculo ao invés de aumentar significativamente o trabalho de outro.

E isso, provavelmente, seria contraproducente.


Como Usar Essa Informação

Se você usa o Leg Press 45º, ou mesmo o Leg Press Horizontal daqueles que vem com uma plataforma que lhe dá uma grande variedade de opções para posicionar os pés (como o da foto inicial deste artigo), posicione-os na altura e com o afastamento que for mais confortável para você, podendo ainda direcionar as pontas dos pés na angulação que lhe for mais conveniente (sem exageros).

E se você só tem acesso a um Leg Press Horizontal Alto e Baixo, alterne entre as duas variações (alto para trabalhar mais glúteos, baixo para trabalhar mais quadríceps), já que as diferenças entre essas duas posições, por serem fixas, são realmente significativas.

Mais uma coisa, embora seja verificada ativação dos músculos posteriores da coxa no Leg Press e Agachamento, outro estudo sugere que isso não é o suficiente para gerar hipertrofia nesses músculos. Diversos estudos apontam que a contração dos isquiotibiais é quase isométrica durante esses exercícios e indicam que o ideal seria dedicar um exercício específico para essa musculatura em seu treino de pernas.


Bônus: Posso Fazer Leg de Ladinho?

Dica para você não parar no Youtube ou nesses perfis de humor fitness do Instagram:

Não Seja Estranho(a)! O banco do Leg Press foi feito para sentar e executar o exercício com segurança, então não invente.

Em compensação, fazer o Leg Press unilateral (sentado de frente, por favor) pode ser uma variação interessante.


Compartilhe este artigo com aquela pessoa que faz mil variações de Leg Press na academia!




Fontes:
1. Escamilla RF et al. "Effects of technique variations on knee biomechanics during the squat and leg press". Medicine and Science in Sports and Exercise, 2001; 33(9):1552-1566.
2. Serrão FV, Cabral CMN, Bérzin F, Candolo C, Monteiro-Pedro V. "Effect of tibia rotation on the electromyographical activity of the vastus medialis oblique and vastus lateralis longus muscles during isometric leg press". Physical Therapy in Sport. 2005; 6: 15-23.
3. Gentil P, Fischer B, Galvão A, Duarte G, Rocha L, Carmo J. "Efeitos da variação do posicionamento dos pés no leg press 45°". Revista Digital Vida & Saúde, 2004.
4. Da Silva EM, Brentano MA, Cadore EL, De Almeida AP, Kruel LF. "Analysis of muscle activation during different leg press exercises at submaximum effort levels". J Strength Cond Res. 2008 Jul; 22(4):1059-65
5. Pereira GR et al. "Influence of hip external rotation on hip adductor and rectus femoris myoelectric activity during a dynamic parallel squat". J Strength Cond Res. 2010; 24(10):2749–2754.
6. McCaw ST, Melrose, DR. "Stance width and bar load effects on leg muscle activity during the parallel squat". Medicine and Science in Sports and Exercise. 1999; 31:428-36.

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