Álcool x Hipertrofia e Testosterona - Inimigos ou Não?

O álcool prejudica seus resultados? Depende. Quer você tenha "saco" ou não, confira aqui a resposta.



A vida é difícil! Você quer resultados, mas você também quer poder beber uma cervejinha, um vinho, ou talvez algo mais forte, como uma vodca ou uma tequila de vez em quando.

Só que o álcool atrapalha seus resultados.

Para decidir se vale a pena ou não beber, afinal, você precisa saber o tamanho do estrago causado quando você bebe. Pois bem, o pesquisador Menno Henselmans e sua equipe tiveram o trabalho de investigar isso para nós.

E como a história da própria vida, a história do álcool e da hipertrofia começa no mesmo lugar: nos testículos.



Álcool e os Testículos

A testosterona é boa para seus resultados: ela sinaliza diretamente para seus músculos que eles devem crescer.

Infelizmente, o álcool não é bom para sua testosterona se você for homem. O álcool (especialmente o acetaldeído) é tóxico para as células de Leydig (localizadas nos testículos), responsáveis por produzir testosterona. No longo prazo, a toxicidade do álcool pode, inclusive, causar atrofia dos testículos, reduzindo sua capacidade de produzir testosterona. É isso mesmo, o álcool pode encolher suas bolas. Além disso, o abuso crônico de álcool pode reduzir a sinalização cerebral para os testículos produzirem testosterona.

O álcool também pode ocasionar um aumento da conversão de testosterona em estrogênio (aromatização) no fígado, diminuindo sua concentração na circulação, além de um possível prejuízo na produção de hormônio do crescimento (GH) e sua secreção durante o sono.

Surpreendentemente, no entanto, beber pouco álcool (1 a 3 doses) é capaz de aumentar sua testosterona nas horas seguintes. Contudo, doses mais altas (4 a 8 doses) podem reduzir sua testosterona em até 37%. Mesmo assim, normalmente sua testosterona se recupera disso em menos de um dia.

Felizmente, se você treinar direito antes de beber, até mesmo doses moderadas de álcool (5-6 doses) ainda parecem aumentar sua produção de testosterona (de 40 a 57% mais do que placebo) dentro de 1 a 5 horas após o treino.

Isso é 1 dose americana padrão de álcool

Agora, antes que você comece a misturar uísque no seu whey pós-treino, cabe ressaltar que, se você tomar um porre de verdade, os danos podem ser bem piores.

Beber 9 ou mais doses de álcool pode diminuir instantaneamente seus níveis de testosterona em até 45%. No dia seguinte, ainda pode ser observada uma redução de até 23% em seus hormônios masculinos. Comparativamente, essa queda nos níveis de testosterona é similar à verificada em fisiculturistas naturais na fase final de preparação para uma competição.



Os efeitos crônicos da ingestão diária de álcool são similares aos efeitos agudos observados acima. O consumo de poucas doses ao dia (1 a 8 doses) parece ter um pequeno efeito em seus níveis hormonais, com uma redução de menos de 10% em sua testosterona. Mas quando você passa a consumir altas doses de álcool diariamente, a testosterona cai consideravelmente – de 25 a 55%. É claro que, nesse ponto, você deveria estar preocupado com coisas mais importantes do que seus músculos e seus resultados na academia (tipo procurar um psiquiatra ou frequentar os Alcoólicos Anônimos).



Ainda, em tempos de balada segura e tolerância zero com álcool e direção, provavelmente seria melhor você pegar um Uber ou um táxi para o happy hour ao invés de sair correndo do trabalho, já que a prática de exercícios aeróbicos extenuantes antes de “entornar os caneco” pode prolongar os efeitos depressivos do álcool na testosterona em cerca de 23%, até 22h após o exercício.



Álcool e Anabolismo Muscular

 Claro que uma queda na testosterona não é algo desejável, no geral. Porém, como exatamente isso afeta a hipertrofia muscular?

Um dos meios pelo qual a testosterona faz seus músculos crescerem é que ela ativa a via de sinalização do eixo mTOR nos seus músculos. E como o álcool diminui seus níveis de testosterona, consequentemente ele diminui a ativação da proteína quinase mTOR, uma importante enzima na sinalização da hipertrofia muscular. Então, não é de se surpreender que a hipertrofia seja afetada pelo consumo de álcool.

Um estudo demonstrou que a ingestão de 9 doses de álcool após o treino diminuiu a síntese proteica miofibrilar (SPM) em 24%. Como referência, cortar 40% das calorias diárias de manutenção de homens adultos, em conjunto com “baixo” consumo de proteína (1,2 g/kg) durante 10 dias, resultou numa diminuição de 36% na SPM. Então, tomar um porre tem um efeito catabólico possivelmente comparável a passar o dia inteiro em cutting (i.e. em déficit calórico).

Além da testosterona, mTOR e SPM, o álcool também prejudica a recuperação muscular.

Em baixas doses (até 4), o álcool não parece afetar a recuperação, nem mesmo a exercícios que causam grande dano muscular (microlesões), tampouco os níveis de testosterona. Já a ingestão de 6 doses de álcool no pós-treino resultou em um decréscimo 11-19% maior na força muscular, comparado ao consumo de suco de laranja, além de uma redução significativa na razão testosterona:cortisol.

No geral, os efeitos agudos do álcool na recuperação são pequenos, mas os efeitos prejudiciais do álcool na síntese proteica e na produção hormonal (testosterona) são provavelmente piores no longo prazo.



Sem Bolas, Sem Problemas!

O álcool normalmente é considerado tão ruim para as mulheres quanto para os homens. Contudo, os problemas hormonais causados pelo álcool nos homens acontecem porque o álcool é tóxico para os testículos. E as mulheres não têm testículos (Pablo Vittar é homem, ok!?). Então, por que o álcool seria ruim para os hormônios das mulheres?

E, na verdade, ele não é. Múltiplos estudos mostram que o consumo de álcool pode aumentar a testosterona em mulheres, e que beber mais álcool está associado a maiores níveis de testosterona no geral, porém nem sempre é o caso.

O álcool também pode aumentar os níveis de outros hormônios femininos, como prolactina e estrogênio. E, ao contrário do que a maioria das pessoas acredita, o estrogênio é benéfico para o crescimento muscular, especialmente em mulheres (principalmente por ser anticatabólico). Em baixas doses não há um efeito significativo, mas beber 4 a 7 doses de álcool pode aumentar os níveis de estrogênio em até 66% no curto prazo.

No longo prazo, beber pelo menos 5 doses de álcool por semana está associado a um maior nível de estrogênio nas mulheres. Outros estudos verificaram que, ao invés do estrogênio, é a testosterona que está positivamente associada ao consumo de 2-3 doses de álcool por dia (14+ por semana).

Só que, embora esses aumentos nos níveis hormonais possam até ser positivos para os seus resultados, eles estão relacionados à toxicidade hepática (i.e. do fígado), que causa uma disrupção no metabolismo hormonal. Ou seja, isso não é um efeito que possa ser considerado “saudável”. Além disso, por aumentar os níveis de estrogênio, o álcool também está associado a um risco aumentado de desenvolvimento de câncer de mama receptor hormonal positivo.

Às mulheres; por não terem testículos!

Mas já que o álcool aumenta os níveis de testosterona e estrogênio nas mulheres, será que mesmo assim ele reduz a sinalização do mTOR para hipertrofia?

E a resposta novamente é não. Conforme já analisamos neste artigo, beber várias doses de vodca (totalizando 1,09g de álcool por kg de massa magra) após o treino reduziu a ativação de mTOR em homens, mas não em mulheres.

É possível que a síntese proteica muscular (SPM) ainda seja atenuada pelo álcool em mulheres devido a efeitos na cascata de reações do mTORC1 (complexo mTOR 1), como a eficiência da tradução proteica. Ratas fêmeas, após a ingestão aguda de álcool, apresentaram redução na SPM de maneira similar aos ratos machos. Contudo, o consumo crônico de álcool somente reduziu o conteúdo e a síntese proteica muscular em ratos machos, mas não em fêmeas.




Conclusão

Nos homens, o álcool reduz a produção de testosterona porque ele é toxico para os testículos. Esse efeito corresponde a uma sinalização anabólica, síntese proteica e recuperação muscular reduzidas. O dano depende largamente da dose de álcool ingerida. Tomar uma lata de cerveja ou uma taça de vinho, provavelmente, não causará qualquer prejuízo. Mesmo tomando alguns drinques por dia, o dano ainda será pequeno, praticamente trivial. Porém, encher a cara na balada ou num pub vai afetar sua hipertrofia muscular de forma semelhante a uma grande restrição calórica (um cutting).

Aquele tipo de noite em que você toma um porre, liga pra sua ex, acorda na manhã seguinte numa casa estranha, com o estômago embrulhado e uma ressaca infernal, e tenta deletar todos os stories comprometedores que postou bêbado no instagram antes que mais pessoas vejam, não só fere sua dignidade como também é um dia perdido em relação à hipertrofia. Mesmo assim, você ainda pode conseguir ganhar músculos no restante da semana.

As mulheres, por uma virtude de não terem testículos, parecem ser isentas de alguma forma aos efeitos deletérios do álcool na hipertrofia. Seus níveis de testosterona e estrogênio inclusive podem aumentar, parece não haver redução na sinalização anabólica e a recuperação muscular não parece ser afetada mesmo depois de beber bastante após o treino. Ainda pode ser que ocorra uma redução aguda na síntese proteica muscular depois de encher a cara devido a efeitos negativos do álcool na tradução de proteínas, mas o consumo crônico moderado parece ser positivo (ou, ao menos, não ser negativo) para os resultados delas.



Como Usar Essa Informação

Antigamente pensávamos que beber era coisa de macho. De homem. No entanto, beber lhe faz “menos” homem, podendo diminuir sua testosterona e até atrofiar seus testículos.

É...segundo a ciência, parece que estávamos errados. Se tem algum sexo forte para bebida, com certeza é a mulher.

O álcool parece ter efeitos menos deletérios e, quem sabe, até positivos nas mulheres, ao menos em relação ao exercício. Quanto à saúde, parece que ele pode ser tão ruim para mulheres quanto para homens.

Agora, se você está de dieta, mesmo sendo mulher, o álcool ainda pode prejudicar seus resultados de perda de gordura.

Cada grama de álcool contém 7 calorias (kcal), perdendo em valor energético apenas para a gordura, com 9 kcal/g (enquanto os carboidratos e proteínas tem 4 kcal/g). Não apenas isso, mas o álcool, apesar de suas 7 kcal serem vazias (i.e. sem nutrientes), é o primeiro combustível a ser usado (eliminado) pelo corpo, “poupando” os demais macronutrientes (principalmente gorduras e carboidratos) que vão acabar sendo estocados no tecido adiposo (como gordura) ou nos músculos/fígado (como glicogênio). Em compensação, o álcool possui um efeito térmico do alimento (ETA) na casa dos 20%, maior do que os carboidratos e gorduras, perdendo apenas para as proteínas.

Para piorar, o álcool ainda diminui suas “inibições”, então você fica mais propenso a sair de uma balada, parar em um drive-thru do Burger King e comer um Mega Stacker Atômico com batata-frita e refrigerante, com quase 2600 kcal por lanche.


Então, da próxima vez que for beber, lembre-se de tudo isso.

Ou pelo menos tente não encher a cara, já que pessoas bêbadas não são necessariamente conhecidas por tomarem as decisões mais sensatas.



Fonte:
1. Henselmans M, Willigen SV. “The effects of alcohol on muscle growth”. MennoHenselmans.com/Articles/Nutrition. 2019 Dec. https://mennohenselmans.com/the-effects-of-alcohol-on-muscle-growth/

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