Preciso Comer de 3 em 3 Horas?

Estudo investiga a diferença entre comer mais ou menos vezes ao dia. Veja aqui as conclusões dos cientistas.


Há tempos somos recomendados a comer de 3 em 3 horas, com argumentos de que isso seria mais saudável e resultaria em maior perda de peso, maior facilidade na manutenção do mesmo e maior saciedade durante o dia.

Já nos últimos anos, têm surgido diversas outras estratégias propondo uma menor frequência de alimentação com refeições maiores (às vezes só as principais refeições do dia), jejum intermitente, entre outras, sugerindo uma maior perda de peso associada a esse tipo de "dieta".

O problema é que essas estratégias não se adaptam ao estilo de vida de qualquer um.

Se sua dieta lhe estressa por ter que ficar pensando em comer frequentemente e escolhendo lanchinhos saudáveis para levar para tudo que é lugar, então comer obrigatoriamente de 3 em 3 horas, definitivamente, não é uma estratégia sustentável para você.

Por outro lado, se você se sente cheio e nauseado depois de comer muito, adotar uma estratégia de fazer uma única refeição gigante por dia, certamente, não vai lhe agradar.

Embora a mudança na frequência de refeições não seja necessariamente uma "dieta", é como vamos nos referir às estratégias relacionadas a "forma de comer" neste artigo.

Com tantas informações desencontradas é natural que fiquemos indecisos e sem saber que tipo de dieta escolher. Isso é frustrante e, na maioria das vezes, mais atrapalha do que ajuda aqueles que querem emagrecer. Parece que todo mundo está sempre atrás da mais nova descoberta, da mais nova dieta, do melhor método, da pílula mágica para perda de peso e recomposição corporal.

Ainda bem que os cientistas ficam tão indecisos quanto nós, pois assim eles resolvem pesquisar qual tipo de estratégia funciona melhor.


O Que Eles Fizeram

Em uma metanálise (uma análise de outros estudos) publicada em 2015, pesquisadores norte-americanos resolveram investigar o quanto a mudança na frequência das refeições influenciava na composição corporal.

Para isso, os pesquisadores foram atrás de todos os estudos que puderam encontrar comparando diferentes frequências de refeições e verificando seus desfechos em relação à composição corporal dos participantes.

Foram selecionados 15 ensaios clínicos randomizados, a maioria envolvendo participantes jovens, entre 18-49 anos (apenas 3 estudos envolviam participantes acima dos 50), indivíduos obesos ou com sobrepeso (apenas 3 estudos continham indivíduos magros) e sem prática de execício concomitante (apenas 2 estudos envolviam um programa de exercícios físicos). Além disso, foram excluídos estudos envolvendo sujeitos submetidos a cirurgia bariátrica.

As intervenções duraram entre 2 e 52 semanas, sendo que a maioria delas durou entre 2 e 12 semanas (a média entre todos os estudos foi de 12 semanas, mas os 3 estudos mais longos foram responsáveis por puxar essa média pra cima).

Os estudos analisaram frequências entre 1 e 9 refeições por dia, sendo que a maioria se situou na faixa de 2 a 6 refeições diárias.


O Que Eles Encontraram

Os pesquisadores verificaram as mudanças na Massa Corporal, Gordura Corporal, Massa Magra e Percentual de Gordura, conforme os resultados dos estudos. Aqui está o que eles encontraram:

  • Massa Corporal: Os participantes dos estudos perderam, em média, 4,41kg de massa corporal. Contudo, a frequência das refeições foi indiferente na perda de peso corporal.

  • Gordura Corporal: Os voluntários perderam 3,55kg de gordura corporal, em média. Houve uma tendência de maior perda de gordura corporal com 5 ou mais (5+) refeições em comparação com 1-2 refeições (cerca de 1,24kg), sem diferenças significativas para 3-4 refeições. Da mesma forma, frequências mais altas foram associadas com maior perda de gordura do que frequências mais baixas de consumo de refeições.

  • Massa Magra: A média de perda de massa magra entre os estudos foi de 1,88kg (lembre-se que a maioria não praticou exercícios). Foi identificada uma associação significativa entre um maior número de refeições e menor perda de massa magra. Houve uma tendência de que 5+ refeições resultassem em maior retenção de massa magra (1,09kg) do que 1-2 refeições por dia. Porém, quando consideradas frequências mais altas vs. frequências mais baixas de refeições não houve diferença na retenção de massa magra.

  • Percentual de Gordura: Em média, o percentual de gordura (%G) dos voluntários foi reduzido em 1,81% nos estudos. Em um modelo de cálculo simples (considerando apenas nº de refeições e diminuição do %G) foi identificada uma tendência associando um maior número de refeições a maiores reduções no %G. Contudo, quando entraram outras variáveis no cálculo (especialmente ingestão calórica), o impacto da frequência do consumo de refeições na diminuição do %G deixou de existir.


Então É Isso? Devemos Comer Várias Vezes por Dia?

Segundo os resultados preliminares das análises do estudo, uma maior frequência no consumo de refeições estaria associado com maior redução de gordura corporal e maior retenção de massa magra. E isso (recomposição corporal) é exatamente o que estamos buscando quando falamos em emagrecer.

Mas vamos com calma. Uma análise de sensibilidade, em que se remove um estudo por vez e verifica-se se o resultado continua o mesmo, revelou que a maior perda de gordura e maior retenção de massa magra encontradas foram altamente influenciadas por um único estudo (IWAO ET AL, 1996).

Quando esse estudo foi retirado da análise, os resultados tanto em relação a gordura corporal quanto a massa magra passaram a ser insignificantes.


O Que Isso Significa Para Você

Aumentar a frequência de refeições frequentemente é indicado como uma estratégia para perder peso. Normalmente, a justificativa para isso é a crença de que uma alimentação mais frequente aumente a termogênese induzida pela dieta, elevando a temperatura corporal por até 8h após o consumo de uma refeição. Os diversos estudos que se propuseram a investigar isso, porém, apresentaram resultados inconsistentes.

Outro motivo frequentemente citado é que o consumo de refeições frequentes aumenta a retenção de massa magra e a síntese proteica, contudo os resultados das pesquisas sobre o assunto também são controversos.

Os achados do presente estudo foram nesse sentido até os autores verificarem que a remoção de um único estudo anulava completamente a significância dos resultados.

Segundo a conclusão dos autores:

Em conjunto com outros estudos "estes achados fortalecem a hipótese de que a frequência de refeições diárias e seu padrão de distribuição deveriam ser determinados por preferências individuais".


Ah, Era Só Isso?

Quer dizer que foi preciso um estudo científico para nos dizer que devemos comer da forma que preferirmos?

Bem, de acordo com dados estimativos, mais de 60% dos resultados de pesquisas científicas tendem a ser nulos. Mas já que vocês perguntaram...

Na realidade, o estudo tem uma grande limitação. Como você está aqui nesse site lendo esse artigo, no mínimo, posso imaginar que você pratique algum tipo de exercício (ou queira começar, pelo menos). Dentre todos os estudos analisados, apenas dois tiveram exercícios físicos associados à intervenção dietética.

Desses, um foi com adultos mais velhos (acima de 51 anos) praticando 200 minutos de exercício por semana e apenas um foi feito com atletas (boxeadores em déficit calórico).

E lembra do estudo que foi retirado da análise alterando os resultados? Pois é, foi justamente o estudo com os boxeadores (IWAO ET AL, 1996). Esse estudo verificou um efeito favorável na composição corporal dos atletas que consumiam refeições mais frequentes (6 vs. 2 refeições).

Infelizmente, a escassez de estudos envolvendo uma população mais atlética em relação à frequência de refeições ainda não permite uma análise conclusiva de seus resultados.

Os autores também citam que as dietas consumidas nos estudos possuíam baixa ou média ingestão de proteína e, como sabemos, proteína é a base da construção muscular. Dessa forma, não é possível extrapolar que os resultados encontrados se apliquem a dietas com alta ingestão proteica.


Como Usar Essa Informação

Nas palavras dos pesquisadores:

"Embora os resultados iniciais da presente metanálise sugiram um potencial benefício de maiores frequências de refeições para melhora da composição corporal, esse achados precisam ser interpretados com cautela".

Considerando que a aderência deve ser o objetivo principal inicial em relação à dieta, o número de refeições consumidas diariamente deve ser uma escolha pessoal quando o objetivo é melhorar a composição corporal (isto é, perder gordura e manter/ganhar músculos).

Ou seja, em condições de déficit calórico a quantidade de refeições ao dia pouco importa (especialmente se você não praticar exercícios físicos). Ajuste-a de acordo com suas preferências pessoais, tolerância e, caso pertinente, objetivos de performance atlética.

Obviamente, o profissional competente para prescrever uma dieta é o nutricionista, mas quem define a quantidade de refeições que vai fazer ao dia deve ser você.

De nada adianta iniciar uma dieta que você sabe que será impossível aderir e manter porque ela não se encaixa no seu estilo de vida.

E, acima de tudo, seja consistente em sua dieta que os resultados virão.



Fonte:
1. Schoenfeld BJ, Aragon AA, Krieger JW. "Effects of meal frequency on weight loss and body composition: a meta-analysis". Nutr Rev. 2015 Feb;73(2):69-82.

0 Comentários