Dormir pouco ainda pode lhe fazer perder 60% mais músculos durante uma dieta.
Há algum tempo atrás, li uma pesquisa que dizia que, em 2018, 76% dos brasileiros relataram
ter feito algum tipo de dieta nos 12 meses anteriores, uma grande quantidade desses por conta própria.
Mas o que mais me preocupou nos dados é que cerca de 40% das pessoas que começaram uma dieta não incluíram a
prática de exercícios físicos na mudança de hábitos.
Outra
pesquisa, essa feita pela Organização Mundial da Saúde, constatou que 45% da
população mundial sofre de algum distúrbio do sono, o que configuraria, segundo
o órgão, uma epidemia.
Juntando
essas estatísticas demonstradas acima, temos uma receita perfeita para um
desastre.
Não
à toa, a epidemia de obesidade continua aumentando e as pessoas, cada vez mais,
vêm apresentando dificuldades no controle do peso.
E se
você acha que a associação dessas três estatísticas está meio fora de contexto, é melhor dar uma olhada
neste estudo.
Em
2010, pesquisadores da Universidade de Chicago publicaram um artigo sobre os
efeitos da privação de sono em indivíduos submetidos a uma dieta hipocalórica.
O Que Eles Fizeram
Os cientistas
recrutaram 10 voluntários, 3 mulheres e 7 homens, de meia idade (41 anos, em
média) com sobrepeso (IMC médio de 27,4 kg/m²) e os submeteram a uma dieta
moderadamente baixa em calorias durante 14 dias, acompanhada de duas condições:
- Na primeira condição, eles podiam dormir até 8,5 horas por noite.
- Na segunda, contudo, podiam dormir apenas 5,5 horas por noite.
Cada
intervenção foi realizada com cerca de 7 meses de intervalo (o mínimo foi de 3
meses), num modelo cruzado, onde todos os participantes foram submetidos a
ambas as condições.
Os
indivíduos eram todos sedentários e não praticaram qualquer tipo de exercício
durante o estudo.
A
alimentação foi fornecida pelos pesquisadores e consistia de uma dieta
individualizada com energia equivalente a 90% da taxa metabólica de repouso
(TMR) dos participantes, dividida em quatro refeições, contendo 48% de
carboidratos, 34% de gorduras e 18% de proteínas.
Os voluntários
foram avaliados em relação ao peso corporal, massa magra, gordura corporal,
fome (em uma escala subjetiva) e quociente respiratório (QR), cujo resultado
permite detectar se o corpo está utilizando mais ácidos graxos, proteína ou
glicose como fonte de energia.
Também
foram realizados exames de sangue a fim de medir leptina e grelina (hormônios
relacionados à fome/saciedade), hormônio do crescimento (GH), cortisol, hormônios da
tireoide (TSH, T3, T3 reverso e T4), epinefrina e norepinefrina (mais
conhecidos como adrenalina e noradrenalina).
O Que Eles Encontraram
A perda de peso foi praticamente a mesma, cerca de 3kg, durante os 14
dias de cada tratamento.
O
grupo que dormiu bem (8,5h) perdeu, em média, 1,4kg de gordura e 1,5kg de massa
magra durante a intervenção.
É,
foi uma bosta, mas espere até ver o outro grupo.
O
grupo que dormiu pouco (5,5h) perdeu apenas 0,6kg de gordura e incríveis 2,4kg
de massa magra.
Para colocar isso em perspectiva, veja o gráfico abaixo:
Ou
seja, o grupo que dormiu pouco, perdeu 60% mais massa magra e 55% menos gordura em
comparação a quem teve uma boa noite de sono. Exatamente o que ninguém procura
(pelo menos não deveria) quando faz uma dieta.
Para colocar isso em perspectiva, veja o gráfico abaixo:
Proporção da perda de peso em Massa Magra vs. Gordura |
Além
disso os pesquisadores detectaram outras diferenças nos exames secundários,
incluindo maior fome no grupo que dormiu pouco, o que acabaria dificultando a
aderência à dieta no mundo real.
O
mesmo grupo também apresentou um maior QR, tanto em jejum quanto após a
refeição, indicando uma maior oxidação de carboidratos e proteínas (o que não é
bom).
Quando
os indivíduos dormiram menos, também foi verificado um aumento da grelina (hormônio
da fome) e diminuição da leptina (hormônio da saciedade), bem como diminuição
da TMR e dos níveis de epinefrina no sangue.
Os
demais hormônios testados não apresentaram diferenças entre as condições.
Por Que Isso Aconteceu
Em
primeiro lugar, os voluntários não se exercitaram e, principalmente, não
fizeram musculação. Eles também não comeram muita proteína, repare que 18% das
calorias em forma de proteína em uma dieta hipocalórica dificilmente atingiria
a quantidade de proteína recomendada.
Esses
dois ajustes, provavelmente, já fariam com que os participantes poupassem mais
músculos e, possivelmente, perdessem ainda mais gordura.
Ademais,
os pesquisadores apontam que "a diferença no QR entre as duas condições sugere
que a falta de sono foi acompanhada por mudanças no substrato energético
utilizado" em direção a uma menor oxidação de gordura.
Em
resumo, o metabolismo dos participantes privados do sono ficou menos eficiente
e eles queimaram menos gordura e mais proteínas (incluindo músculos).
O Que Isso Significa para Você
Segundo
a conclusão dos pesquisadores:
“Esses
resultados ressaltam a importância do sono para a manutenção da massa magra
durante períodos de ingestão calórica reduzida e levantam a possibilidade de
que sono insuficiente possa comprometer múltiplos fatores que contribuem para a
eficácia e aderência a dietas de restrição energética como estratégia para
redução do risco metabólico”.
Se
você chegou até aqui, de alguma forma, acredito que você já esteja fazendo
musculação ou outra modalidade de treinamento resistido.
Alguns
artigos analisados neste site já ressaltaram a importância da ingestão de
proteína, outros tantos já falaram sobre emagrecimento.
Mas
como está seu sono?
Embora
levantar pesos e comer proteína suficiente possa lhe proteger um pouco, o sono
inadequado pode causar uma perda de massa magra maior do que a esperada quando
você decidir perder gordura.
No
estudo, os dois grupos consumiram a mesma quantidade de calorias e proteínas,
mesmo assim, o grupo que dormiu pouco perdeu menos gordura e mais músculos.
Provavelmente,
o mesmo possa lhe acontecer se você estiver dormindo mal e fazendo dieta, ainda
que não esteja acima do peso como os voluntários da pesquisa.
Para
evitar isso, há uma série de atitudes relacionadas à higiene do sono que você
pode adotar para dormir melhor, como:
- Estabelecer uma rotina, dormindo e acordando sempre no mesmo horário;
- Evitar o consumo de estimulantes à tarde e à noite;
- Evitar o uso de aparelhos eletrônicos na cama;
- Evitar a prática de exercícios físicos muito próximo ao horário de dormir;
- Manter o ambiente em temperatura confortável, sem barulhos e luzes.
Além
disso, diversas outras estratégias que podem lhe ajudar a ter uma boa noite de
sono.
Para
os mais desesperados, há, inclusive, suplementos sem efeitos colaterais que
podem ajudar a dormir, como a melatonina.
O
ponto mais importante que podemos extrair do estudo, além de dormir bem, é colocar sua vida em ordem, principalmente o sono, antes de começar uma dieta para emagrecer.
Caso
contrário o tiro pode sair pela culatra, com a dieta tendo o indesejado efeito da
perda de tecido muscular, dificultando cada vez mais o processo de perda de
gordura.
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Fonte:
NEDELTCHEVA, Arlet V. et al.
“Insufficient sleep undermines dietary efforts to reduce adiposity”. Annals
of internal medicine vol. 153,7 (2010): 435-41.
doi:10.7326/0003-4819-153-7-201010050-00006
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